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O sigilo profissional e a possibilidade de violação por conduta do cliente

15/09/2011 - Fonte: Mary Grun

De há muito o sigilo representa um tema difícil e polêmico para o exercício da advocacia. E não poderia ser diferente dada sua importância e conseqüências na atuação do advogado. Ele é instrumento indispensável para garantir a plenitude do direito de defesa do cidadão porque assegura ao cliente a inviolabilidade dos fatos expostos ao advogado. Por isso se lhe atribui status de interesse geral e matéria de ordem pública.

Foto: Getty Images

Antes de ser uma garantia do cliente/cidadão, direito ou dever do advogado, o sigilo é um valor essencial da profissão, sem o qual o indivíduo jamais se habilita a exercer o munus de defensor. Ao mesmo tempo em que cria prerrogativas impõe lealdade e restrições à atuação do profissional.
O sigilo é o valor que inspira várias normas éticas e estatutárias que orientam, as vezes de forma obrigatória, a conduta profissional do advogado, citamos algumas que são passiveis de penalização e que são por ele permeadas: vedação à aparições na mídia usando alegações relativas a processo pendente, vedação a patrocínio simultâneo de clientes com interesses conflitantes, proibição ao patrocínio de causa contra ex cliente etc.
O advogado que toma conhecimento de fatos expostos pelo cliente não pode revelá-los nem deles se utilizar em benefício de outros clientes ou no seu próprio interesse, devendo manter-se em silêncio e abstenção eternamente. O profissional que desrespeita esse princípio está sujeito à infração disciplinar (art. 34 EOAB) e se sujeita à tipificação do crime de violação de segredo profissional previsto no art. 154 do Código Penal. O sigilo profissional é inerente à advocacia e dela não se dissocia.
O atual Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil o qualifica como direito, na dicção do art. 7º, XIX. Da mesma forma, os arts. 229, I do CC e 347, II do CPC tratam o sigilo profissional como um direito. Já o Código de Ética e Disciplina o qualifica como dever, impondo ao advogado seu respeito conforme seus arts. 25 e 26.
Como direito ou dever profissional, ou, mais precisamente, como direito-dever do advogado, é certo que o sigilo profissional, embora rigoroso, não é absoluto, como já se pode perceber na parte final do referido art. 25 do CED e do 34, VII do EOAB que dispõe “constituir infração disciplinar ...violar, sem justa causa, sigilo profissional”.
Com efeito, em situações excepcionais é possível compreender justificada a violação do sigilo profissional. Hipótese que interessa neste artigo ocorre quando o advogado é atacado pelo próprio cliente e, para defender-se necessita revelar fatos sigilosos; em tal situação poderá quebrar o sigilo e sua conduta não será apenada nem será considerada antiética; contudo, a licitude da conduta está condicionada à obediência do advogado aos limites do interesse ameaçado: suas revelações deverão ter o conteúdo mínimo necessário para atender a sua defesa.
O Tribunal Deontológico da Ordem dos Advogados do Brasil já analisou a matéria em pareceres que antecederam a Resolução 17/2000, através da qual se reforça a parte final do art. 25 do CED, declarando textualmente as situações em que há excludente de culpabilidade em favor do advogado: “Art.3º. Não há violação do segredo profissional em casos de defesa do direito à vida, ofensa à honra, ameaça ao patrimônio ou defesa da Pátria, ou quando o advogado se veja atacado pelo próprio cliente e, em sua defesa, precise alegar algo do segredo, sempre, porém, restrito ao interesse da causa sub judice.”
A revelação do sigilo sem violação do princípio também é recepcionada pela doutrina. Para Paulo Lôbo[1], o sigilo “é dever perpétuo, do qual nunca se libera, nem mesmo quando autorizado pelo cliente, salvo no caso de estado de necessidade para a defesa da dignidade ou dos direitos legítimos do próprio advogado, para conjurar perigo atual e eminente contra si ou contra outrem, ou, ainda, quando for acusado pelo próprio cliente”.
Com efeito, se o advogado foi injustamente acusado pelo cliente de ter cometido atos que não cometeu e que irão lhe trazer prejuízos, ou quando seja injustamente ameaçado, é imperioso que possa se defender de tais acusações, não sendo admissível que o direito de defesa do advogado seja tolhido pelos preceitos éticos. O advogado não pode ter seu direito de defesa prejudicado ou em menor amplitude que o direito de defesa dos demais cidadãos.
Registre-se, porém, que o advogado prescinde de autorização do órgão de classe para quebrar o sigilo profissional. Aliás, a Resolução 17/2000 determina claramente que o advogado assume o risco de seus atos pois ele é o primeiro juiz de seus atos; é o que dispõem seus artigos 4º e 5º.
Assim, na excepcional situação do advogado ser atacado ou acusado pelo próprio cliente ou ex cliente, poderá revelar fatos acobertados pelo manto do sigilo profissional com fundamento nos arts. 25 do CED e 3º da Resolução 17/2000 do TEDI. Todavia a excludente de ilicitude só lhe aproveita se as revelações forem feitas no estrito limite e interesse de sua defesa, assumindo o advogado, pessoalmente, a responsabilidade pela violação.
 


[1] In Comentários ao EOAB, São Paulo, ed Saraiva, 4ª ed. p. 65

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